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quinta-feira, 27 de maio de 2010

A Nação com Fome de Tudo!


Outro dia, como quem não quer nada, resolvi pesquisar como andava a vida da Nação Zumbi, sobretudo depois da morte de seu primeiro líder e fundador Chico Science, que se esborrachou num poste voltando de Olinda no carnaval de 1997. Nessa época eu ia para os carnavais de Olinda com Bruno e Sevé, e já ouvia muito a Nação em “Da lama ao caos” e “Afrociberdelia”, que também tocava muito nas ladeiras com os blocos de Maracatu e nas casas da cidade (na época em que ainda era permitido que as casas tivessem sons enormes) e também porque morava com uma galera que curtia o som (Jack Neto) e sempre tocávamos quando nos reuníamos para uma violada (lembro muito de Vlader fazendo o som e Jack entoando “Monólogo ao pé do ouvido” e emendando em “Banditismo por uma questão de classe”).

Da lama ao caos é um marco na música moderna popular brasileira. Junto com Mundo Livre S/A, a Nação cria o movimento Mangue Beat, uma mistura completamente nova na música brasileira, juntando musicalmente o som pesado de guitarras do punk-rock, batidas de funk levadas pelas alfaias, introduzindo definitivamente o maracatu pernambucano nas letras político-sociais nas quais se cantava a miséria recifense, o aumento do abismo social (“o de cima sobre e o de baixo desce”) o cidadão empurrado para o banditismo, os movimentos e revoltas históricas, a vida e a visão dos que vivem do mangue em relação à cidade, sobretudo no hit que é o nome do primeiro disco (verdadeira hino do manguebeat), e mesmo visões cibernéticas de um mundo futurista, idéias que sempre povoaram a cabeça da Nação, principalmente do próprio Chico, como em “Computadores fazem arte”.

Já no segundo disco, Afrociberdelia, acabam fazendo um disco ainda mais ligado ao movimento manguebeat, se afastando um pouco da limpeza sonora encontrada por Liminha para a produção do primeiro disco da banda, mas mesmo assim produziram peças raras da banda, como em “Macô” e “Manguetown”, realizando ainda a regravação muito boa de “Maracatu Atômico”.

Mas esses discos são incontestáveis. Costumo dizer que, se Chico não tivesse morrido, era possível que o Recife declarasse se transformar em Monarquia e ele seria o próprio Rei. Depois da sua morte, certamente que uma incógnita passou pela cabeça dos fãs: “será que o grupo caminhará com vida própria sem seu maior idealizador?”

O disco CSNZ lançado no ano seguinte, como homenagem à Chico não se desincumbiu de desfazer tal dúvida. Ainda trazia o fundador da Nação cantando músicas ao vivo e também, no disco 2 (chamado de “A noite”) era composto por músicas remixadas. Jorge Du Peixe aparecia, pela primeira vez, também nos vocais da Nação.

Verdadeiramente, acho que a banda retoma seu ritmo em 2002, com um disco que leva apenas o nome de "Nação Zumbi".

O disco todo é uma boa mostra do que tem sido a banda a partir daí. Com Jorge Du Peixe (vocalista desde a morte de Chico) muito mais seguro no vocal e nas programações, a banda abre o disco com uma música que hoje é obrigatória nos shows: Blunt of Judah. Também encontra uma mensagem musical das que acho a maior pancada do NZ: Meu maracatu pesa uma tonelada. Essa música tem um riff de guitarra e uma batida tão pesada das alfaias que fico repetindo seguidamente enquanto dirijo ou mesmo escutando no fone de ouvido no celular. É impressionante a força com que os tambores ecoam na cabeça.

Futura, em 2005 é um disco de afirmação contínua da banda, mas é no DVD “Propagando” aos dez anos de existência da banda, que se percebe a densidade e força que a banda tomou. Preparado de maneira completamente delicada, o DVD é todo gravado de uma só vez, em uma só noite, mostrando tudo o que a banda evoluiu nos seus anos de existência.

E depois disso tudo, na minha mísera opinião, os caras conseguiram fazer um disco que, para mim, é o melhor de todos: Fome de Tudo, em 2007.

Fiquei pensando que a mesma sensação de impacto que sofri quando conheci o primeiro trabalho da Nação, senti, novamente, com Fome de Tudo. Vai se escutando cada faixa num crescendo que não tem fim. Aliás, tem, e a gente fica querendo mais.

De fato, depois de 15 anos de existência, parece que esse disco tem a mesma essência do primeiro, com inovações que só enriquecem a história da banda.
Se fosse para escolher uma faixa (no disco anterior seria “Meu Maracatu pesa uma Tonelada”), eu indicaria, para começar, a última: Escutar “No Olimpo” é uma coisa de louco, uma pancada que invade com uma marcação absurda, com guitarra fuderosa e um baixo que, inclusive, está em todo o disco de maneira vibrante. Músicas como Infeste, Bossa Nostra (que abre o disco), Nascedouro, Inferno (onde se encontra, curiosamente, Céu cantando) e a faixa que dá nome ao disco, são verdadeiras pérolas desse último trabalho irretocável da Nação.

Tem samba, tem frevo, baião, tem muito maracatu, tem groove, tem punk, tem rock, tem letras inteligentes e muitíssimo bem construídas, cheias ainda das idéias que povoaram a cabeça de Chico, mas já com autenticidade e cara próprias, de uma banda madura, tranqüila no caminho que trilha e com lugar consolidado no cenário musical brasileiro, tão carente de música de qualidade.

E só pra ter uma idéia da inventividade da criação da Nação nesse disco, vai aí uma amostra da letra de "Infeste".

Eu venho de todas as partes
Por todas as vias
Trazendo as vontades de todas as crias
Eu sou
Uma couraça pros dias de fúria
Nervos de aço pra cada aventura
Corpo fechado até sua altura
Estou

Costas quentes
Dentes acesos
Olhos de espelho
Cabeça de leão
Lançando o perigo na ponta do enfeite
Estica o caminho quem manda no chão

quinta-feira, 20 de maio de 2010

"ABBA The Show" - Recife


Em meio a muita desconfiança, informações equivocadas, outras incompletas, fui ver o show do Abba (ou melhor, "ABBA the show")e logo que entrei em Recife, parando no Chevrolet Hall para comprar os ingressos, eu, minha mãe, minha irmã Deyna e meu primo Marquinhos descobrimos que, sem dúvida, assistiríamos a uma banda cover do ABBA, chamada de Waterloo (nome da primeira música do ABBA a atingir o topo das paradas na Inglaterra), que depois descobri que desde 1996 faz tais apresentações, tendo conseguido, inclusive, licença dos integrantes originais do ABBA, Bjorn, Benny, Agnetha e Frida.
Minha irmã Deyna e eu já tínhamos comentado que, pela importância, a coisa estaria mais para a apresentação da Sinfônica de Londres e que deveria acontecer uma participação dos integrantes do ABBA... mas não foi exatamente o que aconteceu.
De fato, ao entrarmos no show, eu já começava a me questionar onde ficaria a orquestra, porque o palco, apesar de seus 1000 metros quadrados, não estava exatamente preparado para receber uma orquestra.
E eu estava certo: a Orquestra de Londres se resumia a cinco integrantes (todas mulheres) que estavam a postos no canto esquerdo-fundo do palco, atrás das duas backin' vocals, para tocar violinos e violoncelo. Alguma decepção.
E quando o show começou percebemos realmente que estávamos numa apresentação de homenagem ao ABBA original: tudo estava preparado para tanto - as roupas anos 70, a iluminação, os elementos que apareciam nos telões quando as músicas eram tocadas... era realmente um show cover.
Só que existem covers e covers. E se, por um acaso do destino alguém pensou, por algum momento, em pedir seu dinheiro de volta ao descobrir que se tratava de uma banda cover, tal intenção desapareceu nos primeiros minutos da apresentação, onde se descobre a perfeição com que o espetáculo foi construído.
Depois descobri que o quarteto ganhou um prêmio em 1999 numa TV sueca por ser o melhor cover de banda. Aí vi que a coisa já tem bastante tempo e prestígio, tendo lotado casas por toda a Europa e Estados Unidos. São descritos pelo fã clube oficial do ABBA como "o melhor ABBA desde ABBA".
A evolução toda do show é conduzida, basicamente, pelas crooners Camilla Hedren e Katja Nord, esta última, encarna tão fielmente Agnetta que é difícil não entrar de cabeça na fantasia que é a coisa toda toda. A voz é idêntica e a de Camilla é tão potente e marcante quanto era a de Frida. Impressiona todo mundo. Trocam de roupa durante o show, trazendo mais elementos visuais que, durante o show são muito bem montados. Os outros dois componentes terminam de compor o quarteto também extremamente bem travestidos - um tocando guitarra base e o outro no teclado.
O show vai num crescendo, passando por todas as músicas que o público espera, com direito a Coral com umas 30 crianças para cantar "I have a dream" e finalizar com "Thank you for the music", depois de enlouquecer o público em êxtase com "Dancing Queen", que foi, inclusive, pedido pelo público.

Minha infância e adolescência foi muito marcada pelos hits de ABBA e o disco "ABBA GOLD" (1992), com aquela capa preta com letras douradas e músicas que sempre povoaram minha bagagem musical, como Fernando, The Winner takes it all, Mamma Mia, Dancing Queen, Money Money Money, Knowing Me Knowing You.

Mesmo estando desfeita desde 1984, a banda ainda vende mais de 3 milhões de discos por ano, o musical Mamma Mia tem exibição permanente em várias cidades na Europa e apresentações como as que assisti certamente ainda atrairão muitas pessoas pelo mundo todo, apenas com a intenção de reviver (como realmente se revive) músicas de um grupo tão peculiar, de elementos muitas vezes bastante simples em letras e melodias, mas que faz o público se transportar para dentro de uma aura de prazer, de paz, de harmonia e felicidade intensa.

quinta-feira, 6 de maio de 2010

Discos da Minha Vida - Tracy Chapman - Tracy Chapman


Eram idos de 1991 ou 92, eu então com meus 13 ou 14 anos quando meu pai comprou o LP (Long Play para os muitos que nem sabem nem o que é isso) do que eu julguei, como quase todo mundo naquela época, ser um ótimo cantor.
Pois é, cantor mesmo. Somente depois é que soube que aquele era o álbum de estréia dessa norte-americana que, então, já contava com quatro Grammy Awards por um dos mais bem sucedidos álbuns de música contemporânea da década de 80 para cá.
O disco foi primeiramente conhecido aqui no Brasil através da música "Baby can I hold You" que estava na novela Vale Tudo (aquela da Odete Roitman e na qual Reginaldo Faria no final dá uma singela "banana" para o Brasil de dentro de um helicóptero...) e a partir daí era obrigatória em toda rádio de norte a sul do país e, é claro, nos "assustados", junto com "Yes" e "Take my breath away".
Mas essa talvez seja a música menos elaborada do disco.
Na realidade, essa artista, que tem influência no R&B, jazz, música folk norte americana e blues construiu um disco que muito além de baladinhas como a que citei acima, está muito mais ligado à construções políticas do que propriamente ao romantismo puro e simples.
De fato, ela mesma, por sua influência no meio acadêmico norte-americano (de onde verdadeiramente surgiu, fazendo shows com seu violão) e exatamente por suas canções de cunho político, acabou se integrando à Anistia Internacional, participando inclusive de turnês promovendo os Direitos Humanos depois desse primeiro trabalho.
Na verdade, não fosse por "Baby can I hold You" encravada no meio do disco, ele estaria quase dividido em duas partes (como efetivamente acontece no LP), a primeira ativista e, a segunda, romântica.
"Talkin' Bout a Revolution" abre o disco com um violão suave, mas logo a batida pesada acompanha a letra que já nasce falando de uma revolução sussurrada, na surdina, mas que finalmente "estava fazendo as coisas mudarem...", apontando para o que acontecia nas filas da assistência social, dos desempregados, e que as pessoas pobres estariam prestes a pegar o que lhes pertence.
"Fast Car" foi das músicas também mais executadas do disco, no mundo inteiro, e também é uma música que fala do sonho de liberdade, de poder escolher seus próprios caminhos e de ser alguém. Um som bem folk, com muito violão e ótima de cantar no carro, correndo...
"Across the Lines" é também música tipicamente de cunho político, com uma bateria de vassouras de metal e um piano perfeito, denunciando discriminações nos guetos dos Estados Unidos e mundo afora, assim como faz "Behind the Wall", cantada à capela, mostrando a indiferença em relação à violência nas periferias.
Aparentemente muito além de seu tempo, em "Mountais O'things" Tracy começa desejando mais ou menos como faz Zé Rodrix em "Casa no Campo", mas já está completamente antenada no consumo desenfreado (e fútil) e pede para que todos "renunciem a tudo que for obtido através da exploração humana". Bem vanguardista para os anos 90, que foi bem morno com relação à políticas humanitárias. Tudo isso numa levada completamente africana com flautas e bongôs fantásticos.
Se fosse escolher uma música para representar o total do disco, essa música seria "She's Got Her Ticket". A letra fala de alguém que quer andar por aí, sem medo de nada, sem poder ser parada por nada ou por ninguém. Mas o que impressiona, além da música muito bem construída, é a levada folk, com um solo de guitarra que é completamente limpo e marcante, como a própria música. A guitarra vai "cantando" e Tracy cantando "And she'll fly, fly, fly..." e uma bateria seca acompanhando tudo. É ouvir e se encantar.
Chegando ao final, Tracy pergunta (em "Why) "por que os projéteis são chamados de guardiães da paz" ainda em meio à influência da Guerra Fria, mantendo o sentido político do disco e entra nas músicas verdadeiramente românticas (depois de Baby can I hold You).
"For My Lover" fala de um amor sacrificado, disposto a tudo, que tudo suporta, que tudo espera - pois é. É quase uma Epístola moderna de Tracy Chapman aos Coríntios... com uma guitarra pesada folk.
Daí parte para perguntar "If not now, then when" em relação a um amor impaciente e se descontrola completamente em "For You", dizendo não ser dona de suas próprias emoções e fechando um disco com uma batida de violão muito agradável.

Por tudo isso, por essa mistura completamente moderna, aliado à elementos africanos e letras bem construídas levadas por uma voz absolutamente inconfundível, que agrega tantos estilos, esse seria, certamente, um dos discos que fariam parte da minha Arca de Noé, caso desse tempo de me preocupar com tais sobrevivências culturais.
Ainda roda comigo, no carro, em MP3 e ainda tenho em casa o LP dessa artista que, apesar de depois do primeiro espetacular álbum, ter saído um pouco da mídia, ainda continua, até hoje, sendo muito prestigiada em seus discos e excursões.